Em uma era cultural sobrecarregada por um excesso de “conteúdo”, o anúncio de um álbum duplo nem sempre é recebido com entusiasmo. Enquanto um filme de 80 minutos é visto como enxuto, um LP com a mesma duração pode parecer uma jornada exaustiva. No entanto, o cantor e compositor americano Cass McCombs surge para desafiar essa percepção com Interior Live Oak, seu novo álbum duplo de 74 minutos que mantém um nível de excelência do início ao fim, solidificando sua posição como um dos melhores nomes do indie rock.
Um Retorno às Origens Californianas
Interior Live Oak, o décimo primeiro álbum de McCombs, é uma espécie de regresso para casa, focado mais em reconexão do que em nostalgia. O nome, uma referência a uma espécie de árvore resistente nativa do norte da Califórnia, simboliza o retorno do artista à Bay Area, onde ele iniciou sua carreira. Para este projeto, ele reuniu alguns de seus primeiros colaboradores, como Jason Quever e Chris Cohen. O resultado é um trabalho que combina as composições concisas e diretas de seus primeiros anos com a confiança madura de um artista com mais de uma década de uma carreira singular.
Paisagens Sonoras Ricas e Exploratórias
A base da paleta sonora de McCombs sempre foi o folk-rock, mas as bordas são preenchidas com outras cores misturadas de forma criativa. Essa pluralidade está por toda parte em Interior Live Oak. A musicalidade soa classicamente americana, mas com um sotaque próprio e excêntrico. Há uma naturalidade na execução — seja no trabalho de guitarras entrelaçadas de Mike Bones e Matt Sweeney ou na bateria discreta de Quever — que sugere velhos amigos reencontrando um ritmo familiar. Ao mesmo tempo, há uma precisão que mantém os impulsos mais dispersos sob controle, garantindo clareza e coesão.
O álbum passeia por diferentes atmosferas: a faixa “Peace” tem um som empoeirado e hipnótico, com guitarras que carregam um leve sotaque do deserto. Já “Juvenile” muda o ritmo, com um pulso nervoso que lembra o Velvet Underground, criando uma sátira da adolescência que é ao mesmo tempo afetuosa e mordaz.
Letras que Mesclam Sonho e Realidade
Liricamente, McCombs continua a tecer narrativas poéticas repletas de detalhes do mundo real. Em meio a letras por vezes enigmáticas, surgem referências concretas, como a Ponte George Washington em Nova York e a Transamerica Pyramid em São Francisco, ancorando paisagens oníricas em cenários reconhecíveis. Essa abordagem não é nova para ele; em 2012, ele contou a história da denunciante Chelsea Manning em uma canção, e em seu álbum anterior, Heartmind, a faixa “New Earth” dirigiu-se a Elon Musk.
Em Interior Live Oak, ele joga com a fluidez da verdade e da perspectiva. Em “Asphodel”, uma peça estranha e bela sobre uma flor do submundo, McCombs imagina um portal oculto sob a Transamerica Pyramid, onde o mito e a realidade urbana coexistem de forma desconfortável. Ele brinca com a sinceridade em versos que parecem se contradizer, transformando o ouvinte em um cúmplice de sua narração pouco confiável.
Os Destaques de um Trabalho Coeso
O álbum abre com “Priestess”, uma peça expansiva e de queima lenta que serve como uma ode a um amigo falecido. A canção, que remete à juventude de McCombs na Califórnia, mistura melodias com infusão de soul a uma narrativa elegíaca, com detalhes específicos em meio a cenários pitorescos: “Em nosso seminário de contradições / Ella Fitzgerald, ‘thizz’ e ‘whippits’ / você era nossa sacerdotisa”. É uma introdução impressionante — íntima e cinematográfica — que define o equilíbrio do disco.
O talento de McCombs para baladas está bem representado. “Missionary Bell” é imponente e sem pressa, permitindo que seu vocal contido transmita peso sem exagero. No entanto, “Home at Last” pode ser a obra-prima silenciosa do álbum — uma canção sobre anonimato e autoanulação que ressoa com a força de seus melhores trabalhos. Mesmo quando os arranjos são esparsos, como na silenciosa “Miss Mabee”, há uma riqueza no espaço que ele deixa entre as notas. Ao longo de sua carreira, este discreto artista de 47 anos tem percorrido o cenário indie americano, muitas vezes ofuscado por colegas mais badalados, mas construindo, talvez por isso mesmo, um legado mais duradouro e consistente.